Imagens esquecidas do pioneiro Foto Cine Clube Bandeirante estão em exibição no Centro Cultural São Paulo
German Lorca, 87, e Thomaz Farkas, 84, que estão na mostra, lembram histórias de quando eram membros da instituição paulistana
MARIO GIOIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um panorama da fotografia brasileira, que vai de imagens que se tornaram históricas por seu experimentalismo até registros esquecidos, de tom passadista, com fotos "imitando" técnicas de pintura, estão presentes na mostra "Foto Cine Clube Bandeirante - 70 Anos".
Entre as 126 imagens de 48 fotógrafos expostas no Centro Cultural São Paulo até 30 de agosto, há nomes essenciais da área no Brasil, como Geraldo de Barros (1923-1998), German Lorca, 87, e Thomaz Farkas, 84.
Mas a grande maioria é formada por artistas que estão em uma espécie de limbo da história da fotografia no país, mesmo que tenham feito uma produção interessante.
"A atual direção do Foto Cine Clube me pediu para organizar uma exposição em cima dos arquivos que eles mantêm. Há muita coisa boa e que precisa ser exibida para o público", diz Iatã Cannabrava, 46, que assina a curadoria da exposição junto de Mônica Caldiron, da equipe do Centro Cultural São Paulo.
"O meu recorte não se deteve apenas nas imagens que se tornaram mais conhecidas da produção do clube dos medalhões. Vai desde registros de estilo pictorialista [que imitam técnicas da pintura e da gravura] até imagens feitas mais recentemente, nos anos 70 e 80, coloridas e que nunca foram vistas em mostras mais amplas", conta Cannabrava.
Visita
Fundado em 1939, o Foto Cine Clube Bandeirante é considerado o principal catalisador da fotografia moderna no Brasil, em especial entre o final dos anos 40 e o começo da década seguinte. Consolidou o que viria a ser chamada "escola paulista", mas hoje, ainda em funcionamento, passa por um período de ostracismo.
A convite da Folha, German Lorca visitou a exposição no CCSP e lembrou do período em que foi sócio do agrupamento, nos anos 50. Dividindo os experimentos fotográficos com o trabalho de contador, o paulistano do Brás era assíduo debatedor das reuniões acaloradas do clube, que ocorriam em sua antiga sede, na rua São Bento.
Passeando com agilidade pelos corredores da exposição, Lorca se empolga até com registros ultrapassados feitos em trabalhosas técnicas, como o bromóleo, de nomes pouco conhecidos, como Claudio Pugliese. "Há um trabalho de composição interessante; não é ruim", comenta ele, vendo um registro de um pátio andaluz.
Ao ver fotografias de Eduardo Salvatore e José Yalenti, outros fotógrafos que conseguiram projeção, lembra das discussões que ele, Farkas e Barros empreendiam com os mais conservadores.
"O Salvatore ficou décadas à frente do clube e era muito chato nessa coisa de seguir as regras. Gostava muito dele, mas o Salvatore e, muitas vezes, o Yalenti, brigavam feio com a gente. Falavam "Isso não é foto" sobre as nossas experimentações", diz Lorca.
Ao mesmo tempo, o artista não se conforma com algumas das fotografias presentes na exposição, como uma de Aldo de Souza Lima, um mapa estilizado do Brasil feito de café derramado. "É de um simbolismo estúpido, os contornos do Brasil saindo de uma xícara de café caída. Isso mostra que tinha muita coisa ruim por lá."
Lorca também destaca produções arriscadas de nomes não tão conhecidos -Marcel Giró, Gertrudes Altschul, Ivo Ferreira da Silva e Tufy Kanji, entre outros. "Não só quem ficou mais famoso fazia boas fotografias."
Regras
Já Thomaz Farkas salienta a produção de colegas que ficaram menos em evidência, como Fredi Kleemann, Gaspar Gasparian e Chico Albuquerque, e da convivência complicada.
"No começo do clube, era ótimo. Só que, depois, acontecia o julgamento das fotos, por um sistema de notas, dividido em itens. Aí já não dava mais, ficou muito chato", conta ele. "Eu não gosto de me enquadrar em regra nenhuma."
Frases
"Meu recorte não se deteve nas imagens que se tornaram mais conhecidas da produção do clube dos medalhões. Vai de registros de estilo pictorialista a imagens feitas nos anos 70 e 80, coloridas e que nunca foram vistas em mostras mais amplas"
IATÃ CANNABRAVA, curador da exposição ao lado de Mônica Caldiron
"Não só quem ficou mais famoso fazia boas fotografias"
GERMAN LORCA, fotógrafo, sobre a produção de nomes que não se tornaram célebres e estão presentes em mostra
Acervo está em 11 caixas de papelão
DA REPORTAGEM LOCAL
Os curadores da exposição "Foto Cine Clube Bandeirante - 70 Anos" se debruçam desde 2006 nos arquivos da instituição para montar a atual mostra. "Boa parte da história da fotografia brasileira está em 11 caixas de papelão", diz Iatã Cannabrava, ao lembrar do armazenamento da produção do clube, em funcionamento desde 1939 e que hoje tem sua sede na rua Augusta. "Ao ver a mostra pronta em cartaz, dá para atestar como é imprescindível a boa conservação desse acervo. Acho que o ideal é estabelecer uma parceria entre o clube e instituições como o CCSP para que isso não se perca." Cannabrava e Mônica Caldiron destacam, assim como Farkas e Lorca, a produção de boa qualidade de nomes que não ficaram famosos. "Vendo as imagens de um fotógrafo como Eduardo Enfeldt, por exemplo, não dá para entender o porquê de ele não ser reconhecido", diz Cannabrava. Em "Regimento da Madrugada", Enfeldt mostra soldados sentados em um momento de descanso e tira proveito das formas dos capacetes enfileirados. Além dele, a mostra tem outros bons registros de nomes como José Oiticica Filho, Kazuo Kawahara e Rubens Scavone. (MG)
Quando: de ter. a sex., das 10h às 20h, sáb. e dom., das 10h às 18h;
até 30/8
Onde: CCSP (r. Vergueiro, 1.000, tel. 0/xx/11/3397-4002); livre
Quanto: entrada franca
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